novembro 13, 2011

Comentário sobre o filme “Cisne Negro”: Elenco, Figurino, e Caracterização por Luana Araújo


O filme Cisne Negro tem sua narrativa construída em cima do clássico balé de Tchaikovsky, Lago dos Cisnes, que inspirou a temática do filme. Na trama, temos uma adaptação cinematográfica deste clássico, com uma roupagem atual. O elenco central se constitui em um núcleo de bailarinos e bailarinas, protagonizado pela atriz Natalie Portman. O resultado ficou tão magnífico, que ela ganhou o Oscar de melhor atriz neste ano.


Praticamente todos os personagens do filme são dançarinos e dançarinas, fazendo-nos mergulhar no universo do balé nas suas diversas essências. Desde a concepção cenográfica até o lado psicológico do que seria a vida de uma companhia de dança está sendo retratado no filme.
Para recriar este mundo, todos os elementos cênicos são indispensáveis para atingir um resultado final próximo à realidade. Cada detalhe interfere diretamente em como a obra se apresenta para nós sob o olhar do diretor.

Os personagens presentes demonstram várias características existentes na vida de um bailarino: a iniciante, que é Nina, a que não alavancou sua carreira: a mãe de Nina, Beth, a bailarina, que devido à idade, já irá se aposentar, o diretor que almeja remontar um clássico mundial e se consolidar no meio, Lily, a concorrente que pode tomar o lugar de Nina, além dos outros atores, mostrando-nos como as relações neste meio se dão, muitas vezes pautas pela ambição, pelo medo, pela inveja e pelas frustrações.
Este é basicamente o elenco principal e de onde a trama de se desenvolve. A marca do filme é o nível de aprofundamento psicológico dado à personagem de Natalie, sendo este um fator fundamental para podermos analisar toda a realidade construída. Ela interpreta Nina, a bailarina que terá a chance de sua vida em encarnar um personagem universalmente conhecido no meio da dança e, por isso, deve carregar nas costas o peso da responsabilidade que irá vivenciar daqui por diante.

O conflito é de onde emerge todas as relações de Nina, que cria mentalmente uma nova maneira de se enxergar e como ela passara e encarar a realidade e sua própria existência, devendo deixar de lado a menina super protegida, delicada e medrosa para encarar um novo papel totalmente oposto ao que ela foi durante toda vida. Nina só tem em si o Cisne Branco e a partir de agora deve incorporar o Cisne Negro. Esse é o ponto alto do filme e elemento transformador de toda a história.

Isso ocorre graças a essa busca que Nina teve que fazer incessantemente pelo Cisne Negro. De tanto buscar, ele vai aos poucos aflorando dentro dela esse lado sombrio, criando um choque entre a garota meiga do início e nova Nina. Todos esses fatos mudam a forma que ela se relaciona com a mãe e todos a sua volta, a partir daí, ela passa cenograficamente a conviver com outros personagens numa intensidade maior, neste caso é diretor da peça e Lily, que em sua mente passa a ser a inimiga que quer tomar seu lugar.

Tornar-se o Cisne Negro passa a ser o objetivo central da vida de Nina e, enquanto ela representava o Cisne Branco em toda sua ingenuidade, Lily perfeitamente se encaixava naquilo que ela visava ser. Essa aproximação gradativa das duas cria uma relação conflituosa e de muita rivalidade, principalmente pelo medo de Nina ser substituída pela outra. Nessa convivência, ela vai cada vez mais desenvolvendo sua subjetividade obscura.

Essa dualidade entre Nina e seu lado sombrio que aos poucos vem ganhando destaque no filme, muda totalmente o modo de se contar a história e também composição cenográfica. Ela passa a conviver mais sozinha, de lidar consigo mesma, os espelhos passam a ter destaque no filme, já que os diálogos passam a ser estabelecidos diante dele e só por eles podemos ver as duas Ninas. As luzes passam a focar cada vez mais o personagem que preencher o cenário.

A cenografia passa a ter um papel duplo, devendo estar adequada para as visões de Nina, respaldada por aquilo que ela vê e outra criada para mostrar aquilo que os outros personagens do filme vêem, como é o caso do sangue escorrendo por debaixo da porta. Tudo isso cria certa confusão em nós que assistimos, pois passamos a não saber com definição clara aquilo que está no psicológico dela e o que acontece de verdade, as imagens se fundem como se fossem um acontecimento só e somente depois podemos perceber que são fragmentos de uma alucinação. Até no próprio final fica difícil determinar se ela realmente morreu com o caco de vidro enfiado na barriga ou se aquilo não era mais uma visão sua.

Os cenários abordados são de certa forma restritos no que dizem respeito à quantidade, eles basicamente se limitam à casa de Nina e à escola de balé, onde os elementos de composição cênica dão facilmente a entender que se tratam de ambientes onde convivem pessoas ligadas à dança, seja pela sutileza da decoração à objetos que nos remetam a este tipo de lugar e pessoas: caixinha de música, sapatilhas, um teatro, espelhos, piano, etc.



O figurino e maquiagem também são elementos fundamentais, eles, além de servir na composição e contextualização do cenário reforçam as mudanças ocorridas nos personagens, já que a roupa reflete nossa personalidade. Se no início elas eram mais claras, mais compostas, ao longo do tempo ganham tons escuros, dotadas de certa sensualidade.

Esse paradoxo do branco e do preto é facilmente percebido durante o filme e todos os elementos que envolvem cenário, figurino, luz, maquiagem, vão aos poucos se ligando cada vez mais à representação oposta destas duas cores, demonstrando uma transição clara entre o branco (luz) e o preto (sombras), dadas as mudanças psicológicas vivenciadas pela personagem da Natalie. Cada cor passa a ter um destaque maior em determinados momentos e ganham cada vez mais significação estritamente ligada àquilo que elas representam separadamente para nós no senso comum.



Toda essa esfera semiótica nos mergulha em diversos valores amplamente difundidos na sociedade, principalmente com o lado maniqueísta reforçado, mas também quebra o nosso ideário de que os opostos não se atraem. Dentro do filme, os opostos passam a ser uma coisa só.
A maquiagem é também outro ponto impecável, não só na caracterização final da personagem enquanto cisne branco e cisne negro, quando chega a hora de apresentar o espetáculo, onde ela é mais requisitada, certamente graças à representação teatral do balé, como também ao tipo de narrativa que foca num animal, que deve ser incorporado e retratado de forma fidedigna. Também devemos considerar isso nos momentos em que ela vê o lado obscuro florescendo, quando passamos a ver penas saindo do corpo, enquanto no início, ela era praticamente inexistente, destacando o lado singelo da personagem Nina antes do desenvolvimento da trama.

Nesse sentido, os efeitos especiais muito bem feitos contemplam outro ponto inquestionável do trabalho da direção de arte, mas o nível de expressão facial como corporal ficaram extremamente belos na representação de um animal em uma pessoa, principalmente quando estas duas características se juntam e nós não podemos diferenciar um do outro.

Analisar de forma ampla todos os pontos deste filme é desafio dada a imensa quantidade de informações que podemos abstrair partindo dessa perspectiva, pois cenografia não é só ver como os objetos se organizam num espaço a ser filmado, ela contempla a luz, maquiagem, elementos cênicos e com mais intensidade o próprio lado subjetivo, o eu do personagem, e como ele interage com todos os outros elementos presentes, na forma que eles se apresentam para nós e dentro da própria trama.

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